Todo imperialista quer um pai presente

Uma análise equivocada e sensacionalista sobre dois conceitos que não tem tanta ligação assim

Maria Morena Gomes
2 min readJul 5, 2023

Sete, dentro de dez pessoas, têm problemas paternos. Esse dado não existe, mas o que também não existe é o nome do homem que deu vida a milhares e milhares de brasileiros em suas certidões de nascimento. Aqui todos sabemos que paternidade é uma coisa complicada para os filhos, mas muito fácil para os pais, que podem optar por ir embora e não lidar com as crianças.

Movimento esse que gerou a popularização da análise entre os millenium e o hit indie “daddy issues”, do The Neighbourhood. Os Coca-Cola eu nem sei se vale a pena comentar, desceram o dedinho no Bozo depois da síndrome doentia de papais milicos em sessenta e quatro, e hoje mais de seiscentas mil pessoas morreram. Confio firmemente na hipótese deles não lerem números por extenso, só em algarismo, e por isso continuo a narrativa.

Ter problemas com o pai está tanto no sangue brasileiro quanto a falsa cordialidade de chamar garçom de amigão. Mas tanto no sangue brasileiro, que imploramos de tempos em tempos por homens que salvem nossa pátria, ó pátria amada. No Brasil, erguemos pais e os derrubamos num piscar de olhos, ou melhor, a cada clique no .gov na aba de nome paterno , na opção “prefiro não declarar o nome ”. Nesse passo, é mais do que escancarado que nossos heróis não são tão nobres assim, tão leais assim. Eles se entendem como dominantes, mas curiosamente são dominados pelos seus iguais.

Acredito firmemente que todo imperialista, ou no mínimo mama saco de imperialista, tem problema com os pais. É simples, e eu prometo que vou explicar. Pensando na figura do Churchill, grande orador e primeiro ministro inglês. Imperialista e supremacista branco autodeclarado, provocou fome na Índia. Sentou ao lado de Rosenvelt e Stalin. E ainda assim, ainda com todas as questões problemáticas que o embalam, tal como um neném, já ouvi pessoas de supostamente esquerda o elogiando. É preciso admirar qualidades admiráveis!, me disseram.

Incrédula, comecei a traçar padrões entre aqueles que homenageiam Putin, Churchill, líderes nazistas, fascistas, ditadores, filhotes de milicos, etc. E o que eles tem em comum? A busca constante por um herói, um homem de fé que o salvará da desgraça de perder o emprego, de não conseguir ir pra Disney, de virar uber, de perder as tetas do governo. Eles têm em comum a busca por um homem que, não só os salvará, como também os ninará antes de dormir, com sua propaganda bidimensional de homem de negócios, esportista, do povo de camisa verde militar, amante de cachorros, o que for.

O padrão é a necessidade de um pai, um pai presente. Seja a figura démodé do Bozo, ou o patinho apático, ou o presidente nazista ucraniano, e quem sabe o antigo agente da KGB? Seja que homem você veja com problemas paternos, ele elegerá, em seu coração ou nas urnas, um pai para nação. Todo imperialista quer um pai que abrace, cuide, mas acaba encontrando um pai alcoólatra, que bate quando chega em casa e cheira pó na mesa da cozinha.

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Maria Morena Gomes

Aspirante a jornalista, leitora assídua e escritora um tanto medíocre. @morenagomesg